Violência contra a mulher

 

 

 

VCM: uma análise conceitual?


      Para se compreender a violência é preciso considerar a sociedade e suas relações, entrando em contextos como família, a construção histórica dessas relações e os aspectos culturais da sociedade. Existem diferentes visões sobre essa violência à integridade psicológica, social e sexual da mulher, com várias formas de abordagem, pois o assunto, convenhamos, é bastante complexo.

     Na concepção de cidadania e direitos humanos, determinadas práticas passaram a serem vistas como ato de violentar. Comportamentos antes julgados comuns, agora são considerados e classificados como violência. Algumas atitudes como impedir a mulher de trabalhar fora de casa, impossibilitá-la de sair ou ter amigas, impedi-la de usar certos tipos de roupas, bloquear seu convívio social, agressões domésticas, humilhação pública e particular, relação sexual forçada dentro do casamento, atualmente, figuram como atos de violência.

Os governos (municipais) dispostos a combater a VCM devem estar cientes de que:

1) A discriminação sexual não é trivial ou irrelevante em comparação com outros problemas sociais que atingem questões de sobrevivência e bem-estar da população, visto que muitas mulheres são vítimas fatais da VCM, o que quer dizer que apenas pelo fato de terem nascidos mulheres estão em uma posição desprivilegiada e, frequentemente, desprotegidas de políticas públicas que podem garantir mais segurança existencial.

2) O abuso contra a mulher ocorre dentro de um padrão cultural que o propicia, mas isto não quer dizer que não existam coisas a serem feitas. A VCM não é um problema insolúvel, nem tampouco privado ou individual, mas um assunto político e público que requer a atenção do Estado, das instâncias federais, estaduais e municipais.

3) Os Direitos das Mulheres são parte dos Direitos Humanos e, como tais, devem ser respeitados. Ações que visem fazer cumprir os Direitos das Mulheres são ações do âmbito dos Direitos Humanos.

4) O abuso contra a mulher não é inevitável ou amplo demais para ser considerado no escopo das políticas públicas, tampouco sua consideração implica ignorar outros problemas vinculados a Direitos Humanos.

A violência possui várias definições. Ela pode significar uma relação assimétrica de poder com fins de dominação, exploração e opressão (AZEVEDO, GUERRA, 1985); pode infligir o sofrimento (MINAYO, 1990); e pode também ser entendida como toda a ação que trata um ser humano não como sujeito, mas como objeto, anulando ou impedindo sua atividade ou fala (CHAUÍ, 1998). Pelo senso comum, violência é uma palavra derivada do vocábulo latino violentia e significa o caráter ou qualidade de ser violento; constrangimento físico ou moral, ação de empregar força física ou intimidação moral contra alguém para obrigá-lo a submeter-se a vontade de outrem, coação (HOUAISS, 2001). Neves e Romanelli postulam que as atividades humanas são mescladas por dois tipos básicos de agressão: a destrutiva e a construtiva (NEVES & ROMANELLI, 2006). Maio (1972) define a violência como: “...uma organização dos poderes da pessoa a fim de provar o seu próprio poder, a fim de estabelecer o valor do eu..., mas que ao unir os diferentes elementos do eu, omite a racionalidade (MAIO, 1972, p. 153). Dessa forma, é possível entender a violência contra mulher como uma manifestação de relações de poder historicamente desiguais entre o sexo masculino e o feminino, que conduziram à dominação e à discriminação da mulher. 

Falar de violência de gênero pressupõe, portanto, o entendimento de que homens e mulheres têm participação social desproporcional em função de sua condição sexual e que os homens integram um universo simbólico que legitima esta desigualdade, normatizando um padrão de relações sexuais hierárquico, também denominado relações sociais de gênero (AZEVEDO, 1985). Violência de gênero pode ser definida, então, como qualquer ato imposição ou afirmação da força masculina como: violência que resulta ou pode resultar em dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico causado, inclusive ameaças de tais atos, coerção ou privação arbitrária de liberdade em público ou na vida privada (ARAÚJO, 1996). A vitimização de gênero ou violência doméstica contra a mulher envolve tanto abuso sexual de crianças, estupro e abuso físico e psicológico ocasionados por parceiro íntimo que podem acarretar uma série de conseqüências na saúde física e emocional das mulheres. NARVAZ & KOLLER (2006) apresentam o fenômeno da violência contra a mulher como sendo o responsável não só por danos físicos, mas também como elemento comprometedor do exercício da cidadania e dos direitos humanos, bem como do desenvolvimento socioeconômico. Deste modo, a violência contra a mulher deixa de ser um problema privado, passando a ser também um problema social.

                                                                              Hevelin Mattos